Livros e filmes para entrar no clima de ir para a Tchéquia

Resolvi colocar aqui algumas sugestões de livros e filmes para quem quer entrar no clima de viajar para a Tchéquia. Não conheço muito bem a produção artística do país, então peço desculpas se deixar algo legal de fora, mas vou tentar colocar algumas obras que são muito amadas por lá, que representam eventos históricos ou simplesmente algumas obras das quais eu gosto. Sintam-se livres para deixar mais sugestões nos comentários.

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Livraria na Praça Wenceslau

Trens Observados de PertoUma Solidão Muito Rumorosa, de Bohumil Hrabal – Hrabal tem a fama de ser o autor preferido de todo tcheco. De fato, quando eu estava lendo os livros lá, muitas pessoas comentaram sobre esses livros.

Trens Observados de Perto, de Hrabal

A história de Miloš Hrma, um aprendiz em uma estação de trem na Tchecoslováquia ocupada pelos nazistas. Ele observa os trens passarem e fica obcecado em ter sua primeira experiência sexual. Ele conhece uma resistente, e acaba tomando uma decisão. Ele virou filme em 1966, dirigido por Jiří Menzel. A cena dos selos é uma das mais famosas do cinema tcheco. Você vai saber quando assistir.

Uma Solidão Muito Rumorosa, de Hrabal

A história de Hanta, um homem que vive em um Estado policial tcheco há 35 anos. Ele trabalha como um compactador de papel, destruindo livros proibidos, mas acaba por colecionar uma grande quantidade de livros raros. É um livro terno sobre a indestrutibilidade da palavra escrita.

A metamorfose, de Kafka

Franz Kafka é provavelmente o escritor tcheco mais conhecido fora do país, embora ele escrevesse em alemão. Suas obras tem um sentimento de pesadelo, de absurdo, de desorientação. A Metamorfose tem um dos inícios mais famosos da literatura: “Quando certa manhã Gregor Samsa acordou de sonhos intranqüilos, encontrou-se em sua cama metamorfoseado num inseto monstruoso.” (tradução de Modesto Carone) Eu gostei muito de todos os livros do autor que eu li.

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“A literatura: um golpe de machado no mar congelado dentro de nós” – Decoração do Equity Point, um albergue em Praga


A Insustentável Leveza do Ser
, de Milan Kundera

A história de Tomáš, um médico que passa a vida tendo casos com diversas mulheres e descobrindo as suas idiossincracias, Tereza, uma jovem fotógrafa e Sabina, uma pintora que declara guerra ao kitsch. A história se passa em parte durante A Primavera de Praga, em 1968. O autor usa esses personagens para discutir as questões de leveza e peso da vida, desafiando a noção de Eterno Retorno de Nietzsche. O livro virou filme em 1987, sob direção de Philip Kaufman, com Daniel Day-Lewis, Juliette Binoche e Lena Olin nos papéis principais.

Amor e Lixo, de Ivan Klima

Esse livro foi foi proibido na Tchecoslováquia. Depois da Revolução de Veludo, ela foi reimpressa e vendeu centenas de milhares de cópias. Ele é o livro mais bem famoso de Klima. A novela é sobre um artista dissidente impedido de continuar a sua obra, que acaba trabalhando varrendo as ruas de Praga.

Herói Acidental, de Jan Hrebejk

A história de um casal que decide esconder um vizinho judeu, apesar de todos os riscos. Ao fazer escolhas para conseguir mantê-lo seguro, eles se defrontam com a natureza verdadeira daqueles que pensavam que conheciam.


Mala Straná
, de Jan Neruda

Mala Straná em tcheco significa algo como cidade baixa, por ser o bairro construído na parte inferior ao Castelo de Praga. O escritor tem um papel na própria recuperação da língua tcheca na época do Império Austro-húngaro em que o alemão era a língua da instrução. Esse livro é de contos do bairro em que o autor nasceu e cresceu, e tem um sentimento familiar. Hoje, a rua em que ele viveu se chama Nerudova, em sua homenagem. E sim, o Pablo Neruda também tirou o pseudônimo daqui.

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Mala Straná

HHhH, de Laurent Binet

Trata da ocupação alemã e da resistência tchecoslovaca durante a Segunda Guerra Mundial. O título do livro é uma alusão à brincadeira Himmlers Hirn heißt Heydrich, o Cérebro de Himmler se chama Heydrich, que teria circulado na Alemanha Nazista. Heydrich foi o homem encarregado de governar os tchecos, o que ele fez com mão de ferro, ganhando o apelido de O Carrasco de Praga. Dois homens, Jozef Gabčík e Jan Kubiš, foram escolhidos pelo governo no exílio para assassiná-lo, no que acabaria sendo o único atentado bem sucedido contra um nazista de alto escalão. O livro trata dessa operação, bem como dos massacres que foram ordenados em represália.


A Report on the Party and the guests, de Jan Němec

Uma parte da Nouvelle Vague tcheca. Ele é polêmico e extremamente crítico ao Partido Comunista, motivo pelo qual todos os filmes do autor foram proibidos para sempre. Ou assim queria o governo da época, já que hoje eles são liberados. A história do filme é a de um grupo de cidadãos que vai fazer um piquenique quando são abordados por um grupo de homens ameaçadores que pretende interrogá-los.


Mendelssohn is on the roof
, de Jiří Weil

Esse livro é baseado em uma história verdadeira que aconteceu em Praga durante a ocupação nazista. Uma casa de concertos dedicada à música germânica é inaugurada e Heydrich, grande conhecedor de música, fica ofendido ao ver no telhado a estátua de Mendelssohn, um judeu. Ele ordena que a estátua seja removida, mas isso gera um problema. Ninguém além dele sabe reconhecer a estátua, e ninguém se atreve a perturbá-lo para perguntar. Os oficiais responsáveis resolvem retirar a estátua do homem com o maior nariz… Que é Wagner, que os nazistas consideravam um símbolo étnico.

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Margaridas
, de Věra Chytilová

Outro filme da nouvelle vague tcheca, também proibido na época em que foi lançado. A trama é sobre duas jovens que decidem ser más e começam a fazer brincadeiras estranhas, que zombam dos rituais formais do Partido Comunista Tcheco.


The Garden Party
, de Václav Havel

Uma das perguntas que os estudantes sempre me faziam quando eu fiz trabalho voluntário em Praga era se eu sabia quem era Václav Havel. Ele é um escritor e dramaturgo, um dissidente durante o comunismo que passou vários períodos na prisão, teve um papel importante na Revolução de Veludo e foi o primeiro presidente democraticamente eleito da República Tcheca em mais de quarenta anos. Essa peça trata de Hugo Pludek, um jovem de classe média que vai a uma festa em um jardim ao encontro de Kalabis, um homem influente que pode ajudá-lo em sua carreira. Ele tem uma série de encontros bizarros com homens que falam em clichês, simbolizando a sociedade que se conforma com as atitudes do regime.


O Bom Soldado
Švejk, de Jaroslav Hašek

O personagem principal é Josef Švejk, que, por sua estupidez (real ou fingida), repetidamente frustra as autoridades militares austríacas. É discutível entre os leitores se o personagem é realmente estúpido ou se ele está praticando alguma forma de resistência passiva. Mas é a obra tcheca mais traduzida e o personagem é muito amado na Europa Central. Em quase toda cidade em que eu fui, vi um restaurante chamado Švejk, além de estátuas e placas.


RUR
, de Karel Capek

Uma peça de ficção científica que fala de humanos artificiais, e ficou famosa por cunhar o termo robô (robot, a partir do tcheco robota, trabalho). Eles parecem felizes em trabalhar a princípio, mas logo começam uma revolução. Essa peça foi muito influente na ficção científica posterior.

O Cemitério de Praga, de Umberto Eco

Esse romance fala de um dos temas preferidos do autor: teorias de conspiração. O Cemitério Judeu de Praga é uma das atrações turísticas mais famosas da cidade, e pano de fundo para falar sobre os Protocolos dos Sábios de Sião, um documento forjado para fazer crer que houve uma reunião de judeus e maçons que planejavam uma reestruturação da ordem mundial, basicamente uma gigantesca conspiração para conquistar o mundo à la Pink e o Cérebro. Muito do texto era plágio de outros livros e logo provaram que era uma fraude, mas ele não deixou de ser influente: ele foi usado como propaganda pelos nazistas e outras organizações anti-semitas. O romance do Eco tem por protagonista o ficcional Simone Simonini – mas o resto dos personagens é real -, que escreve uma espécie de diário para recuperar a memória, e  conta sua participação em vários eventos do século XIX, inclusive o que viria a se tornar os Protocolos.

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Cemitério de Praga

O Baile dos Bombeiros

Outro clássico da Nouvelle Vague tcheca e o primeiro filme em cores de Miloš Forman. Ele conta a história de um baile dos bombeiros em que nada dá certo, das participantes relutantes de um concurso de beleza aos prêmios ridículos de um bingo, que são quase todos furtados. Depois da invasão soviética para sufocar a Primavera de Praga, ele foi proibido.

City Sister Silver, de Jáchym Topol

Ogrande romance da Revolução de Veludo. É um romance complexo, cheio de referência à história tcheca, à cultura pop e de gírias russas e alemãs, com uma línguagem que lembra um Borges ou um Burgess. Logo que foi lançado, foi reconhecido como um romance fundamental, que fala de toda uma geração. Também foi nosso livro escolhido na Volta ao Mundo em Livros e Filmes. Leia mais aqui.

Algo como a Felicidade, Bohdan Slám

Três jovens adultos, que cresceram em um bairro pobre na República Tcheca, Monika está em um relacionamento com um homem que emigrou para os EUA, e espera um convite dele, Tonik, que tenta reconstruir a casa de sua família, e Dasha, que tem uma relação conflituosa com os dois filhos e com o amante.

Se você está em Praga, à procura de livros para ler e não sabe tcheco, não deixe de ir a The Globe, uma livraria de livros em língua inglesa com um restaurante ótimo. Foi lá que comprei a maioria dos livros acima.

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