Volta ao Mundo em Filmes: Romênia – Polícia, Adjetivo

O cinema romeno produz apenas um pequeno número de filmes por ano, mas eles tem uma ótima reputação e frequentemente ganham os prêmios mais importantes do cinema mundial. Alguns críticos falam de uma nouvelle vague nos últimos anos. Então foi um daqueles países em que é difícil escolher um filme porque as opções são tantas, e tantas delas pareciam dizer muito não só sobre a Romênia, mas que dava para pensar o Brasil.

Acabei ficando com Polícia, Adjetivo, de Corneliu Porumboiu.

O protagonista do filme é Cristi (Dragos Bucur), um policial que está juntando informações sobre um estudante que fuma haxixe. Por oferecer aos amigos, ele está sendo visto como um traficante. Cristi desconfia que o amigo que o denunciou queria era se aproximar de sua namorada. O policial os segue constantemente, monta vigília nas casas dos estudantes, preenche relatórios. E a cada dia ele se sente mais desconfortável com esse trabalho, que, como ele explica aos colegas, em outros países não é questão de polícia.

Os seus dias passam de tocaia, em absoluto silêncio, a espera de que algo aconteça. Quando ele não está lá, ele discute com colegas, o chefe, ou com sua esposa. Como o título indica, o filme é muito preocupado com os significados que uma palavra pode ter, e parece que é sempre isso que ele discute. Pode ser uma música, o uso de um pronome, uma palavra com erro de ortografia, mas cada conotação parece inteiramente relevante para ele.

A tensão maior do filme é entre o que ele considera seu dever profissional e o que ele considera sua consciência. Ele pensa se é justo arruinar a vida desse menino para aplicar uma lei que talvez seja mudada em breve.

Em uma cena memorável, o capitão o faz ler as definições do dicionário para consciência, lei, moral e polícia. A palavra polícia em romeno pode ser usada como adjetivo em duas situações, quando se refere a um romance ou filme envolvendo atividades criminais que são em algum grau misteriosas, resolvidas no fim graças à atividade policial, ou para modificar o substantivo Estado. Para os romenos, o dilema pode ser inseparável do trauma de um Estado policial.

É um filme sobre como pessoas podem ter uma discussão, se os termos têm significados diferentes para cada um deles. A tentativa de resolver as diferenças apelando para o dicionário chega a ser engraçada. É tentar transformar em maniqueísmo uma dúvida moral que estamos acompanhando há uma hora de filme. De apelar para um argumento de autoridade que acaba com o debate. E o capitão não quer apenas que a operação seja feita, ele quer vencer os argumentos de Cristi, ele quer que ele ame o Grande Irmão.

Eu sinto que digo isso em quase todo filme, mas quem não gosta de “filme lento” não vai curtir. Quem está intrigado nos potenciais de intensidade de uma cena de leitura de dicionário e semântica vai amar.

 

Outras sugestões de filmes romenos: 

4 meses, 3 semanas e 2 dias – Cristian Mungiu

A morte do sr. Lazarescu – Puiu

Terça feira depois do natal – Radu Muntean

Se eu quiser assobiar, eu assobio – Florin Serban

Instinto Materno – Peter Netzer

12:08 À Leste de Bucareste – Corneliu Porumboiu

 

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