Eu acordei às seis da manhã, quando o meu trem noturno de Tbilisi finalmente chegou em Zugdidi, e sabia que ainda tinha três ou quatro horas de marshrutka pela frente. Eu achei uma rápido e ela partiu quase imediatamente para Mestia, a capital do Svaneti. Além da noite maldormida, a temperatura tinha caído doze graus desde Tbilisi, então eu estava com bastante sono. Mas foi difícil dormir porque eu queria prestar atenção na estrada, porque parecia o tempo todo que a gente tava entre um lago e uma montanha, cercados de florestas.
O Svaneti é uma região da Geórgia com uma cultura muito própria. Eles tem a própria língua e costumes. O primeiro ponto da cultura do Svaneti que a gente vê são os Koshki, as torres defensivas medievais. A maioria delas foi construída entre os séculos 9 e 13, tanto para a proteção dos locais contra invasões estrangeiras, como para se protegerem um dos outros em casos de rivalidades entre famílias. A Geórgia foi invadida várias vezes no período, pelos mongóis, persas, árabes, e fui em várias cidades que tinham sido destruídas nesse período. Mas o Svaneti nunca foi, o que pode ser por o lugar ser tão remoto e inacessível, pela arquitetura de defesa, ou pela fama dos Svans de serem grandes guerreiros. De qualquer forma, a região virou a caixa-forte da Geórgia: em tempos de invasões, os grandes tesouros do país eram mandados para o Svaneti por proteção.
Hoje, muitas das torres estão abertas para turismo. No início do dia, entrei em uma que estava aberta para quem quisesse ver a vista, por 3 lari. Quando eu entrei, a moça na entrada, que falava apenas georgiano, começou a apontar para mim e depois para as pedras do interior da torre, e colocava as mãos em uma, depois a de cima, como se fizesse uma mímica de escalar a pedra. No meio da subida entendi o que ela quis dizer. É que as torres geralmente tem cinco ou seis andares, e geralmente cada um tem só uma abertura em cima com uma escada de madeira apoiada para chegar no próximo andar. E em alguns deles, a escada não chegava até o topo, e eu tinha que usar a pedra para fazer alguns degraus improvisados. De qualquer jeito, deu para chegar até o topo. Depois acabei subindo em outra, parte de um café.
Mestia também é a sede do Museu de História e Etnografia do Svaneti, perfeito para quem quer aprender um pouco mais sobre a cultura. A maioria dos objetos do museu vem da “época de ouro” da história da Geórgia, entre os séculos 10 e 14. Algo que eu aprendi aqui é que os Svans usavam peles de carneiro para pegar pepitas de ouro nos rios, e depois a pele ficava cheia de pedacinhos, o que pode ser a origem da lenda grega do Tosão de Ouro. O lugar onde Jasão vai buscá-lo, Colchis, é exatamente nessa região da Geórgia. Ele também tem uma vista ótima para o centro histórico de Mestia. Como em outros museus na Geórgia, a entrada era 10 lari, mas para estudantes era apenas 1.
Eu tinha ido para o Svaneti principalmente porque a cultura parecia interessante, mas a maioria das pessoas vai para lá pela beleza natural. Quase todo mundo na rua estava com roupa de ginástica, e passava os dias fazendo as trilhas em torno da cidade, que é conhecida como “a Suíça do Cáucaso”. Eu, que não tenho nenhuma experiência nisso, optei por fazer uma curtinha, para a Geleira Chalaadi. Ela fica a cerca de uma hora andando do centro da cidade, e no albergue outras pessoas tinham me dito que esse caminho não era bonito, era na beira da estrada, e não tinha proteção do sol. Então acabei dividindo um táxi para o início da trilha com duas meninas do albergue, o que também foi ótimo porque, como eu disse, não tenho experiência com trilhas e prefiro não fazer uma sozinha. Mas foi uma boa oportunidade ver uma geleira antes que ela acabe, ou pelo menos essa foi nossa piada de mau gosto enquanto a gente subia a trilha. As meninas comigo eram uma da Alemanha e uma da Croácia, e garantiam que o barulho que a gente tava ouvindo era do gelo estalando, e que no verão não dá para chegar muito perto de uma geleira.
Mas Mestia tem outras trilhas extremamente populares, como a dos lagos Koruldi, que parece muito cênica, mas que leva o dia todo, de oito a doze horas pelo retorno, dependendo da sua velocidade. Outra trilha famosa é a que leva ao topo do Monte Ushba, uma trilha de em torno de seis horas. Também dá para chegar ao topo do monte pegando um teleférico. Finalmente, a trilha que a maioria das pessoas do albergue tava fazendo foi a trilha de quatro dias até Ushguli, uma das cidades mais famosas do Svaneti. A trilha tradicional passa por várias vilas nas montanhas e parece interessante, mas eu optei na opção preguiçosa de ir de carro, como day trip. A cidade é incrível, então o próximo post vai ser só sobre ela.
O meu albergue era o Manoni, que era bem barato e oferecia café da manhã e jantar por preços decentes. Em uma das noites, eu jantei lá, mas nas outras quis explorar o que tinha de noite na cidadezinha de Mestia, e acabei achando lugares que curti bastante. O primeiro que tentei foi o Pub e cinema Dede. É que quando eu estava lá esse filme tinha acabado de sair, Dede, que foi o primeiro feito na língua Svan. Ele conta a história de uma mulher tentando desafiar as tradições locais, que até pouco tempo incluíam vinganças de sangue entre famílias. Eu gostei especialmente da parte que mostrava a tradição de receber os espíritos dos antepassados em cada casa. Como o filme lá é motivo de orgulho, esse pub improvisou um cinema, e o passa cinco vezes por dia.
Outro lugar que visitei foi o Café Laila, na praça principal da cidade. Eles tem concertos de música local e espetáculos de dança, algo que me deixa um pouco desconfiada. Sempre acho que esses lugares tem estereótipo de serem caros e ruins. Mas o Leila foi incrível, e não parecia armadilha para turista porque a maioria das pessoas lá eram georgianos, que levantavam e começavam a dançar com os garçons quando a música tava boa. Além disso, comemos e bebemos tanto que a gente achou que tinha um erro quando a conta deu só 15 lari (5 euros) por pessoa. Recomendo.
Esse foi o passeio por Mestia. Clique na imagem para ler todos os posts sobre a Geórgia.
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