Volta ao Mundo em Livros: Emirados Árabes Unidos – Temporary People

Cerca de 80% da população dos Emirados Árabes Unidos é de estrangeiros. Nos últimos tempos, tenho lido muitas reportagens que mostram a situação desses trabalhadores estrangeiros, na maioria, pessoas do subcontinente indiano que trabalham em condições terríveis, com os empregadores tendo o direito, entre outros, de reter o passaporte deles. Por isso, quando comecei a procurar um livro para os Emirados, e achei Temporary People, de Deepak Unnikrishnan, um autor que nasceu na Índia e cresceu em Abu Dhabi, achei que seria perfeito para o projeto. 

Temporary People é composto de 30 contos, com uma linguagem marcada pelo encontro de pessoas diferentes, com gírias inglesas, árabes, hindis e malaias. Cada capítulo é chamado de “chabter”, ao invés do inglês “chapter”, já que os árabes não tem o som do “p”. Os contos também são cheios de realismo mágico. Neles, um passaporte criar braços, pernas e um bigode, e sai correndo pelo aeroporto, ou a língua de um adolescente pula da sua boca, as palavras derramando na rua, um exército de baratas luta pela independência.

Em um dos meus preferidos, “Birds”, uma mulher trabalha como enfermeira na cidade, colando os trabalhadores que caem dos arranha-céus. No início do conto, quando o autor usa o verbo “tape” para falar do que ela faz, eu imaginei que ela gravava vídeos mostrando a tragédia, que ela estava fazendo um documentário, mas então o autor descreve como ela anda pelos canteiros de obras procurando cada parte dos trabalhadores, que esperam no lugar onde caíram, subitamente mudos, e os cola com fita adesiva para que eles possam voltar a trabalhar. Outro conto, “Mussafah Grew People”, trabalhadores são criados em laboratório, crescem como plantas, geneticamente programados para viver só o tempo necessário para trabalhar. Imagino que o Paulo Guedes adoraria a idéia. E claro, eles nos fazem pensar muito na situação dos trabalhadores. Em outro, “Le Musée”, uma vila é destruída em uma guerra, e onze habitantes são escolhidos para viver nela em casas de vidro, com cada aspecto das suas vidas (e mortes) sendo observados por aqueles que destruíram a sua cultura.

Procurei algumas entrevistas com autor, e ele fala muito sobre essa questão de ser “temporário”, de crescer em uma cidade sabendo que continuar lá não era uma opção, que um dia ele teria que “voltar para casa”. O livro, segundo ele, tentou “examine temporary residents like them and the homes they have left behind, and illuminates how temporary status affects psyches, families, memories, fables and languages.” Gostei muito do livro, e foi uma excelente escolha para os Emirados.

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