Volta ao Mundo em Livros: Inglaterra – Girl, Woman, Other

Quando eu saí com a Inglaterra no sorteio, sabia que seria quase impossível escolher um livro. Sempre é quando o país publica milhares de livros todos anos, e eu já tinha uma lista impossível de livros de lá que eu quero ler. Entre os clássicos, os premiadíssimos e os livros modernos que parecem muito interessantes, fiquei com um que já é inescapável: Girl, Woman, Other, de Bernardine Evaristo, descrito como “a love song to modern Britain and black womanhood”.

O livro é dividido em doze histórias, que segue doze personagens diferentes, principalmente mulheres pretas. A primeira delas é Amma, uma dramaturga que recentemente conseguiu uma posição no prestigiado National Theatre, depois de décadas de ser ignorada pelo establishment, considerada radical demais. Ela serve como um fio condutor do livro, já que a maioria dos personagens a conhecem. 

Essa forma episódica faz com que personagens retornem constantemente, vistos por pessoas diferentes. A Amma pode falar sobre a melhor amiga dela de infância, que não se sente muito confortável círculos “radicais” da Amma e tem uma vida mais tradicional, e depois a gente tem a perspectiva de duas jovens que estudaram com uma professora meio controladora, e depois a gente vê que elas estão falando da mesma pessoa, e temos ela também como narradora, oferecendo as perspectivas dela sobre os mesmos relacionamentos e os mesmos eventos. 

As doze personagens, apesar de se esbarrarem constantemente em Londres, são imensamente variadas, de uma mulher de 93 anos a uma social influencer não binário. Não só as experiências de vida delas são diferentes, mas a forma como elas lidam com questões de raça, sexualidade, e com a Inglaterra moderna. Eu li em uma entrevista com a autora que o livro surgiu justamente pegando uma personagem que era menor na história de outra, e resolvendo contar a história dela também, a perspectiva dela. E que justamente porque a autora cresceu em um ambiente em que não tinha muitas histórias de mulheres pretas, ainda mais se fossem queer como tantas do livro, ela quis nos dar um tanto. Ela começou com a Carole, uma sobrevivente de abuso sexual, que sai de um bairro pobre para conseguir bolsa em Oxford, e que trabalha para um banco quando ela narra suas experiências, muito marcadas por se sentir excluída da Inglaterra estereotípica, e querer pertencer a ela:

She overheard loud reminiscences about the dorms and drugs of boarding school, Christmas holidays in Goa, gap years spent building a school for the poor in Kenya. Most students weren’t like that, but the really posh ones were the loudest and the most confident, and they were the only voices she heard. Nobody talked loudly about growing up in a council flat on a skyscraper estate with a single mother who worked as a cleaner. Nobody talked loudly about never having been on a plane, seen a play or the sea or eaten in a restaurant with waiters.

Com a diversidade das experiências do romance, definitivamente foi um livro que me fez pensar muito sobre a Inglaterra de hoje, a modern Britain da qual os jornais sempre falam. Gostei muito da escolha, e foi um dos melhores livros que li em 2020.

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