Bologna, a vermelha: Três anos na cidade mais ativista da Itália

Da primeira vez que me chamaram para um Flashmob em Bologna, não entendi. Achei que era aquela modinha que tinha antigamente, em que todo mundo dançava de repente no meio de uma praça. Mas na Itália, Flashmob é como eles chamam um protesto na rua, principalmente os menores, organizados rapidamente, e isso é algo que em Bologna acontece o tempo todo.

Desde a época medieval, Bologna é conhecida por três apelidos: la dotta, a sábia, por ter a universidade mais antiga do mundo, la grassa, a gorda, porque a comida de Bologna é incrível, e la rossa, a vermelha. Dizem que originalmente o terceiro apelido vinha das cores das casas e dos muros – Bologna é mesmo toda avermelhada. Mas no século 20, a cidade chegou a ter o maior partido comunista fora da União Soviética, com mais de um terço da cidade inscrita, o apelido assumiu um significado novo, o do ativismo político. Hoje, quando outros italianos pensam em Bologna, muitas vezes pensam em uma cidade em que só tem estudantes, que passam o dia comendo e protestando. Ou seja, para mim, é o paraíso.

Um dos maiores e mais tradicionais eventos da cidade é o Pratello R’esiste, a festa que comemora a libertação da cidade durante a Segunda Guerra. Hoje ela é uma festa antifascista, que acontece todo abril, e eu fiz um post sobre ela em 2019. Mesmo em 2020, com a pandemia do covid, ela não deixou de acontecer: as pessoas imprimiram fotos delas e colaram nos pórticos, para a rua ser ocupada mesmo quando está vazia.

“Lockdown capitalim”

Em Bologna, fui em muitos protestos feministas, por direitos LGBTS, por problemas que estão acontecendo no mundo inteiro, já que estudantes do mundo inteiro que vem para cá fazem protestos, e assim fiquei sabendo um pouco mais do que está acontecendo em lugares sobre os quais os jornais não falam. E também vi muitos protestos que pediam pelo “direito à cidade”, por acomodação de preço decente para estudantes, por jardins, por centros sociais e espaços culturais.

Protesto pela Marielle do coletivo Bologna pela Democracia no Brasil

Muitos dos protestos eram do Non Una di Meno, a seção italiana do movimento argentino, e por isso aprendi muitos dos cantos deles, as versões italianas do “Direita, recua, o povo tá na rua”. Vou colocar alguns que sempre são cantados, para quem tiver curiosidade.

Insieme siam partite juntas nós partimos

Insieme torneremo juntas voltaremos

Non una, non una nenhuma, nenhuma

Non una di meno nenhuma a menos


Tremate, tremate tremam, tremam

Le streghe son tornate as bruxas voltaram

Carabinieri, ma che ci state a fare? Policiais, o que vocês estão fazendo aqui

A casa ci sono i piatti da lavare em casa tem os pratos para lavar

I panni da stirare as roupas para pendurar

I pupi da guardare as crianças para olhar

Il cane da pisciare o cão para mijar

Le piante da bagnare as plantas para regar

Il cesso da sturare a privada para desentupir

Allerta allerta allerta chi cammina

Lotta transfemminista dalla sera alla mattina

Che tremi che tremi che tremi ogni fascista (o maschilista, razzista)

Oggi Bologna è tutta femminista (o antirazzista)

Tradução:

Alerta, alerta, alerta quem caminha

Luta transfeminista da noite até a manhã

Que trema, que trema, que trema cada fascista (ou machista, racista)

Hoje Bologna é toda feminista (ou antirracista)

Siamo il grido Somos o grito

Altissimo e feroce  Altíssimo e feroz

Di tutte quelle donne De todas aquelas mulheres

Che più non hanno voce Que não tem mais voz


Lo stupratore non è malato O estuprador não é doente

È figlio sano del patriarcato É o filho sadio do patriarcado

La notte ci piace nós gostamos da noite

Vogliamo uscire in pace queremos sair em paz

Ci piace pure il giorno também gostamos do dia

Levatevi di torno Saia de perto


Laici gli ospedali Laicos os hospitais

Laici i consultori Laicos os consultórios

Obiettiamo gli obiettori Objetamos os objetores


La nonna partigiana A avó partigiana

Lo sai cosa ci insegna você sabe o que ela nos ensina

Antifasciste sempre antifascistas sempre

Obietta su sta fregna objeta essa buceta

Os “obiettori”, ou objetores de consciência são os médicos italianos que se recusam a fazer abortos. Na maioria das regiões italianas, eles são maioria e isso restringe muito o acesso ao aborto, que deveria ser garantido por lei.

Ecco la società  eis a sociedade

dei preti e dei padroni dos padres e patrões

Violentano le donne estupram as mulheres

Difendono gli embrioni defendem os embriões


Y ahora que estamos juntas

Y ahora que sì nos veen

Abajo el patriarcado 

Se va a caer, se va a caer

Arriba el feminismo

Que va a vencer, que va a vencer

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