Volta ao Mundo em Filmes: França – Une Fille Facile

É bem difícil escolher um filme só para representar a França, já que é um cinema que eu curto muito. Mas teve um filme recente que parecia revisitar alguns temas comuns do cinema francês sob uma perspectiva nova, e que por isso achei que podia ser interessante para o projeto: Une Fille Facile, da Rebecca Zlotowski, que eu vi no Netflix. Em português, ele foi traduzido como A Prima Sofia, mas eu gostei do nome original, “uma garota fácil”, que já coloca uma crítica.

O filme já começa com uma homenagem a um clássico do cinema francês, La Collectionneuse, de Éric Rohmer, com imagens de uma mulher sozinha em uma praia quase vazia em Cannes. No filme de Rohmer, dois homens se sentem atraídos por uma menina de dezessete anos, principalmente, pela sua “liberdade sexual”, como as frases de propaganda do filme falavam então.

O filme começa com Naïma (Mina Farid), uma menina que faz dezesseis anos no último dia de aula, e começa a fazer planos para as férias de verão. Ela quer fazer um estágio no restaurante do hotel de luxo em que sua mãe trabalha, e uma audição para uma escola de atores com seu melhor amigo, Dodo (“Riley” Lakdhar Dridi). Sua prima Sofia (Zahia Dehar) vem visitá-la, extremamente bronzeada e carregando bolsas Chanel para ambas, e logo a arrasta para o iate de luxo de um homem que ela acabou de conhecer, um empresário brasileiro.

O filme foi muito descrito em críticas como um bildungsroman, a história do aprendizado de Naïma com a prima mais velha e experiente, que diz para ela ignorar questões como amor, e procurar sensações, aventuras. Naïma não é porém uma menina inocente, ela entende porque Sofia anda sem dinheiro, porque ela come antes de sair para jantar com homens para observá-los melhor, porque ela se faz de burra, ela vê as lições que a prima passa, e a vida dos cruzeiros de luxo, e presta atenção em tudo, inclusive nos criados silenciosos que observam seus patrões nos iates e restaurantes. O filme conta a história de uma jovem como a de La Collectionneuse, uma francesa sexy e misteriosa como a de tantos filmes, mas pela perspectiva de alguém que sente afeto por ela, e que não ignora as relações de poder escondidas quando a mesma história é contada pela perspectiva de um homem branco rico. Afinal, como Naïma diz, o dinheiro só é fácil de ignorar quando você tem. Naïma tinha crescido em Cannes, mas nunca tinha estado em um barco, e ambas as jovens são descentes de imigrantes do norte da África. O filme pega uma personagem cliché, a “garota fácil” com um talento para se cercar de homens ricos, e nos mostra como a sociedade ao mesmo tempo a sexualiza e a culpa por ser sexualizada, como ela é sempre exposta, mas não é nunca ouvida.

A atriz que interpreta Sofia, Zahia Dehar, é muito conhecida na França por causa de um escândalo, já que ela se prostituía quando ainda era menor de idade, e teve relações com vários jogadores de futebol famosos, que chegaram a serem indiciados, mas foram absolvidos com a justificativa duvidosa de que eles não sabiam que ela era menor. Ela é uma pessoa perfeita para trazer profundidade ao papel de Sofia.

No final, achei que foi um ótimo filme para a França, exatamente por pegar um cliché e revisitá-lo por uma perspectiva nova. Gostei bastante da escolha.

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