Livros e Filmes para entrar no clima de uma viagem para o Cáucaso

Procurar por livros e filmes locais é sempre parte do meu processo de me preparar para uma viagem. Procurar por livros do Cáucaso foi um desafio, com pouquíssimos traduzidos para o português, e muitos difíceis de achar mesmo em inglês. No entanto, isso é mais um motivo de colocar aqui os que me interessaram, e que são uma boa introdução à região. Como de costume, estou colocando livros de autores dos países da região, Armênia, Azerbaijão, Geórgia e Rússia, mas também de viajantes e estudiosos, ou romances que se passam por lá.

The color of pomegranates – Serguei Parajanov

O filme é um tratamento poético da vida de Sayat Nova, um poeta e trovador armênio do século XVIII. Ele tem poucos diálogos e imagens fortes, muitas delas baseadas na poesia do autor. O diretor disse que as imagens foram baseadas nos manuscritos iluminados armênios, e o filme frequentemente aparece em listas dos melhores filmes já feitos.

The Caucasus, an Introduction – Thomas de Waal

Uma análise profunda do sul do Cáucaso – Armênia, Azerbaijão e Geórgia, com suas regiões e enclaves. De Waal fala principalmente do período pós 1991, com as lutas pela independência e os três conflitos que se seguiram – o Nagorno Karabakh, a Abkhazia e a Ossétia do Sul. 

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Desde que Otar Partiu – Julie Bertuccelli

O filme conta a história de três mulheres georgianas vivendo juntas: Eka, sua filha Marina, e sua neta Ada. Elas esperam notícias de Otar, o outro filho de Eka, que, por causa da crise econômica na Geórgia no início dos anos 90, emigrou para Paris. Marina recebe um telefonema contando da morte do irmão, mas, como o estado de saúde de mãe é frágil, ela mente e começa a falsificar cartas de Otar. No entanto, Eka, que é apaixonada pela França e estranha a falta de telefonemas do filho, resolve vender sua coleção de livros raros e compra três passagens para Paris. O filme tem mais de uma semelhança com Adeus, Lênin!, e é uma visão humorosa sobre a crise dos anos 90 e sobre as diferentes culturais entre as gerações de georgianos, crescendo em um país tão mudado.

Khadji Murat – Lev Tolstói

Durante o século XIX, quando o império russo colonizava o Cáucaso, esse virou um tema importante da ficção russa, e vários autores da época passaram pelo serviço militar ou exílio lá. Tem o Prisioneiro do Cáucaso do pai da literatura russa, Púchkin, o Herói do Nosso Tempo, de Lermontov, mas aqui vamos falar do Khadji Murat. O romance fala de um rebelde caucasiano na luta contra a incorporação da Ossétia e do Daguestão no Império Russo. 

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Ararat – Atom Egoyan

O filme conta a história de uma equipe de filmagem e uma família em Toronto que trabalham em um filme baseado no Genocídio Armênio e na resistência de Van. Além de falar do evento em si, a obra fala muito de representação pela arte, com o filme-dentro-do-filme. O filme fala de muitos dos símbolos da Armênia e da sua cultura, como o monte Ararat.

Ali e Nino – Kurban Said

O romance segue a relação tabu entre Ali, um azeri muçulmano, e Nino, uma georgiana cristã, na Baku da primeira guerra. O livro é conhecido por mostrar muito das duas culturas, e por ter tido uma influência enorme em ambas. Hoje Ali e Nino é uma rede de livrarias no Azerbaijão e uma estátua em Batumi, no litoral da Geórgia, por exemplo. A história do pseudônimo Kurban Said e das especulações que causou também já merecia por si só um livro.

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Calendário Atom Egoyan

O filme armênio conta a história de um fotógrafo canadense que é contratado para fazer um calendário com imagens de igrejas armênias, e que faz a viagem com a esposa, descendente de armênios que também trabalha no projeto como tradutora, e com um motorista local interessado em contar um pouco dos locais. Essa parte é entrecortada com cenas do ano seguinte, em que o fotógrafo vive sozinho em Toronto.

Esse filme foi meu escolhido para representar o país na Volta ao Mundo em Filmes, e o review já está aqui

Leyla e Majnun – Nizami Ganjavi 

Outra história de amor proibida, só que essa escrita séculos antes, e famosa por revolucionar a poesia da região no século 12. As imagens dos amantes Leyla e Majnun aparecem em todo lugar no Azerbaijão e no Irã, e só por isso já vale a pena conhecer um pouco da história. 

The Knight in the Panther Skin – Rustaveli

Shota Rustaveli é o autor clássico da Geórgia, que dá nome à maior avenida de Tbilisi e é considerado o pai da literatura natural. Os versos, escritos no século XIII, contam a história da amizade entre dois heróis, Avtandil e Tariel, e a sua missão de encontrar a sua amada, Nestan-Darejan. O romance é dedicado à rainha Tamar, que governava o Reino da Geórgia da época.

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Dede – Mariam Khatchvani

Quando eu estava no Svaneti, nas montanhas da Geórgia, vi em todo lugar a propaganda desse filme, o primeiro a ser filmado por lá e na língua local. A história de uma mulher tentando desafiar as tradições, ele passava cinco vezes por dia em um pub de Méstia. Foi uma boa introdução aos costumes da região.

Bread and Ashes – Tony Anderson

No verão de 1998, Tony Anderson fez uma viagem pelas montanhas da Geórgia. Ele queria principalmente visitar as comunidades isoladas das montanhas, e investigar se elas tinham uma cultura comum, e desafiar a imagem esteotípica do Cáucaso como uma barreira impenetrável. O livro é um relato apaixonado dessas culturas.

And Then We Danced – Levan Akin

Filme georgiano recente, bem recebido no circuito dos festivais, mas polêmico na Geórgia, por mostrar dois homens em uma relação homossexual. Ele fala de dois dançarinos de danças tradicionais, um ambiente muito marcado pelo machismo, e constrói uma história sobre a Geórgia de hoje, com o benefício extra de nos dar a oportunidade de ver a música e a dança típicas do país.

Data Tutarshia – Chabua Amirejibi

O romance conta a história de um fora-da-lei georgiano na época da ocupação tsarista do país. Ele é famoso por combinar partes mais aventureiras com elementos dostoievskianos sobre destino e identidade. Acima de tudo, é uma defesa da liberdade pessoal contra um sistema repressivo. Ele já foi comparado a um Robin Hood georgiano.

Burning Orchards – Gurgen Mahari

O romance conta a história da Resistência de Van, contando sobre o cerco otomano à cidade e os massacres cometidos pelos otomanos. O contexto é do genocídio armênio, uma campanha sistemática para acabar com minorias cristãs vivendo na Anatólia, principalmente os armênios, com massacres, estupros e deportações forçadas. O próprio autor é um sobrevivente. Ele escapou de Van em 1915, quando ele tinha doze anos, e viveu em um orfanato até conseguir reencontrar a mãe, que também tinha sobrevivido.

Esse filme foi meu escolhido para representar o país na Volta ao Mundo em Filmes, e o review já está aqui

Dagny, or A Love Feast – Zurab Karumidze

Um romance que desafia convenções, que começa na Tbilisi de 1901, seguindo as últimas três semanas da vida da pintora Dagny Juel-Przybyszewska nas três semanas antes do seu assassinato.A segunda parte mistura mito e política em um “love fest”, um evento planejado para restaurar o propósito cósmico da humanidade e evitar o totalitarismo. Uma obra famosa do modernismo georgiano.

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Pomegranate Orchard – Ilgar Najaf

Um filme de 2017 que conta a história de um filho de um fazendeiro no Azerbaijão que volta para casa depois de 12 anos. Ele mostra as dificuldades que a família passou em uma fazenda de romãs, e como eles reagem quando o filho volta para levar sua esposa e filho para Moscou.

Stealing the Moon – Konstantine Gamsakhurdia

Esse romance é conhecido pelo seu estilo “soviético” – uma história de amor durante a coletivização da Abkhazia. No entanto, ele foi escrito com tanta ironia que a maioria dos leitores só conseguiu lê-la como um protesto. Ela é muito contraditória, denunciando tanto a religião quanto o governo soviético.

Artush e Zaur – Ali Akbar

Um romance entre um homem azeri e um armênio, o livro é considerado tabu nos dois países. Em parte por falar de uma relação homossexual, o que só foi legalizado no Azerbaijão nos anos 2000, e em parte por ser uma relação entre dois povos que estão em guerra até hoje e tem uma fronteira fechada. Nenhuma editora do Azerbaijão aceitou publicar o livro, e o autor o mandou para uma editora na Mongólia. Ele logo foi proibido no país. 

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Nabat – Elchin Musaoglu

Esse filme do Azerbaijão conta a história de uma mulher presa em meio ao conflito do Nagorno-Karabakh, que no entanto nunca é mencionado. Quando os soldados inimigos avançam, o seu isolamento cresce, e ela fica presa nas montanhas com uma loba. Esse filme foi meu escolhido para representar o país na Volta ao Mundo em Filmes, e o review já está aqui

The Forty Days of Musa Dagh – Franz Werfel

Um romance baseado em eventos verdadeiros do Genocídio Armênio, uma tragédia em que os armênios cristãos vivendo no Império Otomano foram quase exterminados. O romance conta uma história de resistência, em uma cidade sitiada pelo exército por quarenta dias. Ele foi publicado em alemãos em 1933 – um aviso sobre os perigos do racismo e sovre os efeitos da perseguição e genocídio, que não foi ouvido na sua época.

Kvachi – Mikheil Javakhishvili

A história de um vigarista, Kvachi Kvachantiradze, descrito como um misto de don Quixote e Felix Krull. Um enganador, perpetraor de fraude de seguro, ladrão de banco, associado de Rasputin, diretor de cinema, revolucionário e cafetão. Originalmente denunciado como pornográfico, hoje o livro é considerado um clássico da literatura georgiana.

A Man Was Going Down the Road – Otar Chiladze

Um dos romancistas mais importantes da Geórgia do século 20, Otar Chiladze é conhecido por misturar mitos antigos com a história contemporânea do país. Nesse caso, ele pega o mito de Jasão e os Argonautas, que teriam visitado a Geórgia nas suas explorações, e o transforma em uma alegoria da anexação soviética. Desafiando os censores, Chiladze inventou a literatura pós-moderna da Geórgia.

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A Ilha do Milharal – Giorgi Ovashvili

Uma ilha aparece no meio de um rio durante e primavera, ela não tem dono e tem terra fértil. Um homem da Abkhazia, sem lugar desde o conflito nessa parte da Geórgia, constrói uma barraca simples, e junto com sua neta órfã, planta milho na ilha. Ele foi candidato aos Oscars em 2014, e por isso chegou a ser lançado no Brasil.

Journey to Karabakh – Aka Morchiladze

Um jovem viaja da Geórgia para o Karabakh, a região contestada entre a Armênia e o Azerbaijão, para comprar drogas mais baratas. Capturado primeiro pelos armênios e depois pelos azeris, ele descobre que não está com muita pressa para voltar para casa. Esse romance é considerado um dos maiores best-sellers da história da Geórgia, e depois foi adaptado para o cinema em 2005.

Repentance – Tengiz Abuladze

Em uma cidadezinha da Geórgia, o prefeito morre e é sepulto. No dia seguinte o cadáver dele aparece no jardim da casa de seu filho. Uma mulher é acusada de desenterrá-lo, e diz que ele não merecia um enterro, tendo sido responsável por uma perseguição em estilo stalinista da cidade. O filme lida com essa herança, ainda mais impressionante em um país que ainda tem avenidas Stalin em várias cidades, e um grande museu na cidade onde ele nasceu.

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In Bloom – Nana Ekvtimishvili e Simon Gross

O filme se passa em Tbilisi em 1992, o primeiro ano depois do colapso da União Soviética. Duas adolescentes de catorze anos, Natia e Eka, passam o tempo em uma Tbilisi dominada pela violência, onde “seqüestros de noivas” ainda são comuns e elas tem que passar horas na fila do pão a cada poucos dias. Para se proteger, elas conseguem uma arma, que é passada de mão em mão cada vez que elas acham que a outra precisará mais dela.

Esse filme foi meu escolhido para representar o país na Volta ao Mundo em Filmes, e o review já está aqui

My Happy Family –  Nana Ekvtimishvili e Simon Groß

Uma comédia que se passa na Geórgia, onde é comum que uma família de várias gerações vive sob o mesmo teto. Manana, de 52 anos, decide se mudar da casa dos pais, onde ela morava com o marido e os filhos, e a decisão choca todos a seu redor.

Requiem for the Living – Alan Cherchesov

Em uma vila remota do Cáucaso, um menino perturba o status quo quando ele devolve um cavalo roubado a seus donos. Com medo de uma vingança, já que as vinganças de sangue da região podem destruir gerações, os pais dele escapam e deixam o menino sozinho na vila. Ele é inteligente e tem sorte, mas ele logo vira um alvo para a suspeita da vila. O autor usa muitos dos mitos da Ossétia no romance, que se passa nessa região do sul da Rússia.

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Tangerinas – Zaza Urushadze

Durante a União Soviética, um dos crimes cometidos por Stalin foi o envio de populações inteiras para outras regiões e países. O filme Tangerinas acontece décadas depois disso, em uma vila de estonianos na Abkhazia, a região georgiana que passou por uma guerra quando o país ficou independente, e que ainda é ocupada pela Rússia. Todos os habitantes do país querem voltar para a Estônia, exceto por Margus e Ivo, que esperam pela colheita das tangerinas.

Esse filme foi meu escolhido para representar a Estônia na Volta ao Mundo em Filmes, e o review já está aqui

Solar Plexus: A Baku Saga in Four Parts – Rustam Ibragimbekov 

Solar Plexus é a saga da vida de quatro amigos vivendo em Baku, a capital do Azerbaijão. A história descreve as suas vidas e as mudanças na sociedade em perspectivas diferentes entre os grandes expurgos cometidos por Stalin e a independência do país em 1991. 

Stone Dreams – Akram Aylisli

Essa novela fala dos pogroms de Azeris contra Armênios em Sumgait e Baku, e o drama das duas nações no conflito do Nagorno Karabakh. Ele mostra Azeris que atacam vizinhos armênios e azeris que os protegem, mas foi o bastante para ele ser chamado de traidor da pátria, enquanto protestos aconteciam em frente à zasa do escritor de 75 anos. Esse foi o filme escolhido para representar o Azerbaijão na Volta ao Mundo em Livros, e o review já saiu.

The Mountain and the Wall – Alisa Ganieva

Conhecida como o primeiro romance do Daguestão, uma das províncias mais isoladas no sul da Rússia. O livro se passa em um futuro próximo, mas com toques de distopia, em que o governo russo manda construir uma muralha para separar as províncias muçulmanas no Cáucaso do resto do país. Ganieva toca em muitos temas interessantes e atuais, como a construção de muros, a instrumentalização política da diferença e a sua transformação em maniqueísmo.

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Vodka lemon – Hiner Saleem

Em uma vila Yazidi na Armênia, ainda sofrendo economicamente do colapso da União Soviética, Hamo, um viúvo com três filhos, ainda visita o túmulo da esposa todo dia. No cemitério, ele conhece Nina, uma viúva que trabalha em uma barraquinha na estrada chamada de Vodka Lemon. A Armênia entre a realidade crítica e uma fábula otimista.

A Small Corner of Hell: Dispatches from Chechnya – Anna Politkovskaya

A jornalista Anna Politkovskaya, assassinada em Moscou em 2006, escreveu muito sobre a guerra da Chechênia, falando dos esquadrões de morte russos, os políticos complacentes, a resistência chechena e os civis pegos no fogo cruzado. Esse é o segundo livro dela sobre o conflito, mas que é considerado uma das leituras principais para entender o conflito.

The Eighth Life – Nino Haratischvili

Recém-publicado e já definido como um Guerra e Paz georgiano, o romance fala da Geórgia dos anos 90, na seqüência do colapso turbulento da URSS. Insurreições na Abkhazia e na Ossétia do Sul eram apoiadas pela Rússia, e o primeiro líder da Geórgia independente foi forçado a deixar o país. Tiroteios no meio da rua e filas por pão que duravam a noite toda se tornaram eventos comuns. A autora fala do percurso tortuoso da Geórgia até hoje, ainda presa entre o sentimento pró União Europeia, o nacionalismo crescente e a nostalgia soviética. Foi o escolhido para representar a Geórgia na Volta ao Mundo ao Livros, e o review está aqui.

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