Volta ao Mundo em Livros: Botswana – A Question of Power

Quando eu comecei a procurar um livro para representar o Botswana no projeto, ouvi falar sobre A Question of Power, de Bessie Head, e o livro tinha vários pontos que me interessam muito, então imediatamente foi o escolhido. 

Descrito como autobiográfico, o livro conta a história de Elizabeth, uma mulher birracial que se muda da África do Sul para o Botswana com o filho pequeno. Elizabeth cresceu em uma família que também era birracial acreditando ser filha deles, mas aos treze anos ela foi levada para uma escola de elite, onde a diretora abruptamente lhe revelou que a sua mãe biológica era uma mulher branca de classe alta, cuja família a tinha trancado em um hospício por ter relações com um homem negro. Elizabeth nasceu nesse hospital, e foi colocada para adoção pela família da mãe. Ela foi rejeitada por vários casais que tentaram adotá-la, alguns depois de semanas de convivência, por ser birracial. Ela cresce muito marcada por não ser aceita nem entre os brancos nem entre os negros, em uma sociedade em que relações interraciais são punidas por lei, e a própria existência dela é evidência de um crime. Ela também se preocupa muito por ter uma mãe considerada louca.

O modo como a cabeça da Elizabeth lida com tudo isso é entrando em surto, e é isso que o romance tenta mostrar. Ela tem alucinações muito vívidas, e descreve a visita de várias criaturas. A primeira é Sello, uma influência boa, muito baseada nos interesses de Elizabeth por religiões orientais. Tem também Dan, um espírito que promete amá-la e protegê-la, mas que sempre a ataca. Além disso, tem Wild-Eyed Medusa e Sello in the brown suit, duas figuras agressivas, dois pequenos ditadores que acham que ninguém é bom a não ser eles mesmos. Enquanto isso, ela também tenta conviver com as pessoas da cidade onde mora, inclusive Camila, uma voluntária dinamarquesa completamente apaixonada com a própria caridade [sic] e completamente condescendente com todos ao seu redor.

Eu pensei bastante em outros livros que também falam de doença mental, como Nervous Conditions, meu livro da Zâmbia, e The Memory of Love, meu livro de Serra Leoa, em que o narrador comenta que um médico europeu que foi ao país depois da guerra civil disse que mais de 99% das pessoas lá sofrem de transtorno de stress pós traumático. Por um lado, se essa é a reação normal à uma guerra, não devia ser patologizada. Por outro, é uma forma de tratar um problema coletivo como individual – não que eles não precisem de tratamento individual, mas eles também precisam de uma solução coletiva para o problema por trás. E nesse caso, o sofrimento dela estão muito relacionados com ser vítima de preconceito, algo que também é uma experiência coletiva e que tem que ser combatida como um problema social. 

Foi um livro desafiador, na primeira metade principalmente, e a história é difícil de seguir, é difícil até saber o que é real e o que não é. Mas ele é muito recompensador, e foi uma boa escolha para representar o Botswana.

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