Volta ao Mundo em Filmes: Coréia do Sul – Parasita

Na hora de escolher um filme para a Coréia do Sul, achei dezenas de filmes que pareciam muito interessantes. É um país que tem um cinema bem intrigante, e a disponibilidade é tão grande que parecia impossível escolher um. Então acabei usando o projeto como oportunidade para ver Parasita, de Bong Joon-ho, o filme que ganhou um número enorme de prêmios e tem sido falado como o melhor de 2019.
O filme conta a história da família Kim, que mora em um pequeno apartamento em um porão. Quando o filme começa, eles ficam sem Wifi porque uma vizinha finalmente colocou uma senha na própria conexão, e andam pelo apartamento com o celular para cima, tentando achar uma nova conexão livre. Eles trabalham dobrando caixas de pizza, e as primeiras cenas mostram bem a miséria do lugar.
Ki-woo (Choi Woo-shik) o filho da família, é visitado por um amigo mais rico, Min-Hyuk (Park Seo-joon) que chega com um presente, uma Suseok, uma pedra enorme que, na cultura coreana, traz prosperidade. Ele também traz uma oferta de emprego, porque ele está prestes a estudar fora do país, e quer que Ki-Woo o substitua como professor particular de uma menina rica, Da-hye (Jeong Ji-so). Os pais querem um universitário, e Ki-woo nunca passou nos exames de admissão, mas Min-Hyuk se oferece para dar uma recomendação porque ele acha que os caras da sua faculdade salivariam em cima da menina. É bem irônico que ele confia que Ki-woo não vai se aproximar dela porque ele é pobre, enquanto a família rica imediatamente confia nele porque acham que ele é rico, como o amigo.
Ki-woo consegue o trabalho imediatamente, e a família rica, os Park, decide chamá-lo de Kevin. Percebendo uma brecha na família, ele sugere sua irmã Ki-jeong (Park So-dam), para dar aulas de arte. É uma cena ótima, em que ele brinca com o óbvio deslumbramento da família pelo que é estrangeiro, dizendo que não se lembra o nome coreano da professora, mas que as pessoas a chamam de Jessica. Logo logo eles conseguem trazer a família inteira para trabalhar na casa, sem que os Park saibam que eles são todos parentes.
O filme é muito bem humorado, e as tramas da família Kim para enganar os Park passam quase como um filme centrado em um grande golpe. Porém, o golpe não era tão perfeito como eles imaginavam, quando a antiga governanta da casa volta para a casa dizendo que esqueceu algo no porão, e essa é uma virada absolutamente insuspeita. Aliás, o fato de que o segredo está no porão é muito significativo, porque a casa, com sua arquitetura moderna e aberta, vira um personagem do filme, e as escadas se tornam muito importantes.
O filme é uma meditação sobre classe. Tem o fato de que os Kim, vivendo em um porão um pouco abaixo do nível da rua, conseguem se sentir superiores a pessoas que vivem ainda mais abaixo, literal e metaforicamente. A pobreza deles é uma circunstância, a dos outros parece patética, completamente diferente. No entanto, para a família rica eles têm um cheiro próprio, que Park Dong-ik (Lee Sun-kyun), o pai, define como cheiro de metrô, e que os Kim concluem que é o cheiro do subterrâneo. Em uma cena no final do filme, uma tempestade é uma pequena inconveniência para os Park, que tem que cancelar uma viagem para acampar, mas destrói tudo que os Kim possuem, e essa é uma imagem próxima demais da desigualdade que a gente vê no Brasil para não impressionar.
Fiquei pensando muito sobre o título. A primeira vista, parece que ele vai se referir aos Kim, que se agarram na oportunidade de enganar a família rica. Depois a gente descobre mais gente ainda vivendo às custas deles sem que eles nem percebam. Mas os parasitas mesmo são os Park, que falam tanto que não gostam de funcionários que “passem do limite”, mas não tem a menor vergonha de ligar para eles a qualquer momento do dia ou da noite, nem que seja para vir ao aniversário do filho deles, e pensa que eles tem é que achar bom porque estão sendo pagos.
Gostei muito do filme, foi um outro lado de um país sobre o qual nos jornais a gente quase só lê para elogiar o sistema de educação ou a qualidade de vida (mas meu livro da Coréia do Sul, The Vegetarian, também revelou muito sobre o machismo da sociedade). Concordo que foi um dos filmes do ano de 2019, e também uma ótima adição à Volta ao Mundo em Livros e Filmes.

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