Volta ao Mundo em Filmes: Afeganistão – Osama

A indicação mais persistente que achei sobre filmes afegãos foi de Pedra de Paciência, a versão cinematográfica do livro que li para o país aqui no projeto. E por mais que eu tenha gostado da história, não queria que ela fosse todo o meu contato com o país aqui no blog. Por isso resolvi escolher outro, e acabei ficando com Osama, de Siddiq Barmak.

O filme conta a história de uma família de mulheres, as únicas sobreviventes depois que todos os seus parentes homens morreram nas guerras e invasões que o país sofreu nas últimas décadas. Elas são três gerações, uma menina pré-adolescente (Marina Golbahari), sua mãe e sua avó, e, quando a história começa, elas estão vivendo sob o Taliban, que colocou diversos entraves para que mulheres trabalhem fora de casa. Com isso, a mãe perde o emprego em um hospital e elas não podem usar transporte público sem um parente do sexo masculino, então as possibilidades de encontrar um trabalho novo são mínimas. Com isso, ela teme que a família inteira logo passe fome.

Sem outra alternativa, elas resolvem vestir a menina de menino para que ela possa encontrar um trabalho. No início ela tem medo que o Taliban a mate, mas a avó a convence com histórias folclóricas do Afeganistão. É um pouco difícil ver a família tomar essa decisão e cortar o cabelo da menina, porque durante o filme também vemos a brutalidade policial com manifestantes usando burca e punições judiciais desumanas para mulheres que agiram de forma um pouquinho independente. Mas para mim ficou bem claro que eles não tinham mais escolhas. 

Também é um tema que já apareceu mais de uma vez por aqui. Meu filme da Albânia tinha uma virgem jurada, que abdica da sua sexualidade para ter os direitos reservados para homens em uma cultura muito fechada. E um livro que li no Marrocos e recomendei para quem vai para lá, L’Enfant de Sable do Tahar Ben Jelloun, conta a história de uma menina criada como menino pela família, já que só ter meninas era fonte de vergonha e complicava a questão da herança, e como ela lida com essa identidade dupla como adulta.

Com Osama, o risco parecia mais imediato. Ela começa a trabalhar com um vendedor de rua, que sabe quem ela é, mas a aceita porque era amigo do seu pai. Ela também fica amiga de um menino, que é quem lhe dá um nome novo, Osama. Mas o Taliban começa a reforçar a presença na área, e obriga todos os meninos a irem para uma medresa, uma escola corânica. E, nesse ponto, parece inevitável que ela seja descoberta, e eu só imaginava o que aconteceria com ela e com sua família. Mas vou parar de contar por aqui para não entregar muito.

Osama foi filmado em Cabul, com um elenco de amadores. O diretor disse que escolheu a menina que faria Osama quando a viu pedindo dinheiro na rua. É um bom lembrete que o Afeganistão pós-Taliban não virou o que os EUA prometiam. Hoje em dia ainda vemos notícias de meninas sendo casadas à força com velhos, com pessoas da família, com os homens que as estupraram. O Taliban é uma das construções mais cruéis da história da humanidade, mas não devemos esquecer que não era o único empecilho para a vida das afegãs.

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