Meu tour de três dias para o deserto do Saara (e alternativas para o seu ser diferente)

O meu tour pelo deserto do Saara foi um festival de desorganização e armadilhas para turistas. Quando cheguei em Fez, o dono do meu albergue, o maravilhoso Riad Verus, estava fazendo piadas com os tours baratos (para quem ganha em euros) que te levam para o deserto mas ficam mais tempo em lojas do que atrações, param em restaurantes caros para ganhar comissão, e onde os guias te assediam na frente da fogueira. Parecia um check-list do que aconteceu no meu tour.

No final, tive experiências boas, mas porque os lugares são maravilhosos e porque tive a sorte de ser colocada em uma van que tinha pessoas ótimas. A companhia foi fundamental para eu ter bons sentimentos em relação a esse tour, e, como eu estava viajando sozinha, foi pura sorte.

Eu tinha reservado um tour no Hostel Majorelle em Marrakesh, e ele seguia um itinerário bem tradicional de 3 dias 2 noites no deserto, com volta para Marrakesh ou transfer para Fez. O tour já começou mal, quando o dono do Majorelle começou a mandar mensagens estranhíssimas e quando eu descobri que eu tinha pago mais por esse tour que a maioria da van (eu paguei 900 dirhams, a maioria das pessoas pagou 800, vi gente que chegou a pagar 1300).

Dia 1:

No dia 1, os operadores do tour nos prometeram paradas em Ait Ben Haddou, Ouarzazate e no vale de Dades. Eu achei que seria corrido – só de Marrakesh para Ouarzazate são cinco horas de estrada, e parecia que não ia ter como ver nenhum desses lugares por tempo suficiente, e eles pareciam alguns dos lugares mais interessantes do Marrocos. Então resolvi ir para Ouarzazate por conta própria e me juntar ao tour no fim do primeiro dia. Sinceramente, foi a melhor decisão que tomei nesse tour.

Eu vi Ouarzazate e Ait Ben Haddou com calma e no meu tempo, e ambos vão ter posts próprios aqui no blog. As pessoas da minha van descreveram a parada em Ait Ben Haddou como dez minutos com um guia, que os buscou na van, depois ele falou que ia mostrar um artesanato local interessante, pinturas que eles fazem com açúcar e depois esquentam, para a imagem aparecer lentamente. Eles ficaram lá por meia hora, com o vendedor fazendo pressão para que eles comprassem a pintura, e depois o guia falou de mau humor que eles tinham cinco minutos para explorar a cidade e voltar para van, e disse que o pagamento dele não estava incluído no pacote e fez todo mundo pagar um pouco a mais.

Ait Ben Haddou Marrocos

Depois eles foram levados a um restaurante caro no meio do nada, para que eles não tivessem escolha, enquanto eu comi um tagine em Ait Ben Haddou com vista para a cidade por 35 dirhams (3,5 euros). Eles passaram vinte minutos em Ouarzazate, e foi nessa hora que a van me buscou no albergue.

Ouarzazate Kasbah interior
Dentro da Kasbah de Ouarzazate

A van dirigiu por mais umas três horas e chegamos no vale de Dades. Até fazermos o check-in no albergue, estava escuro, então só o vimos da janela da van. Nós tentamos sair um pouquinho antes do jantar e ver um pouco da cidade, mas não conseguimos ver quase nada. O albergue tinha jantar incluído, e os banheiros tinham água quente, o que foi uma boa surpresa, mas não tinham wifi, o que eu também não esperava.

Tour tres dias duas noites saara vale dades
Pedimos ao motorista para parar para uma foto na manhã seguinte

Dia 2

No segundo dia, estávamos prontos e esperando pela van às oito. A primeira parada do dia foi no vale Todra, onde o motorista disse que tínhamos quinze minutos. É uma ravina com um riozinho transparente, e estava no sol, e depois de passar algumas horas na van, dava vontade de ficar bem mais tempo, de fazer hikes lá perto. Ninguém olhou a hora quando saímos, e depois custamos para encontrar de novo a van, então demoramos bem mais.

Depois, paramos em Tinghir, uma vila Bérbere no Vale do Draa. Aqui outro guia nos buscou na van, e nos levou para ver as plantações lá perto, mostrando alguns produtos tradicionais, e pelas ruazinhas da cidade. A cidade era bem interessante, e eu gostei do que ele nos contou sobre a história e as tradições dos bérberes.

O guia perguntou se queríamos conhecer uma cooperativa feminina de venda de tapetes, e algumas pessoas do tour tinham interesse. Lá fomos recebidos por um vendedor e por uma mulher que estava posando para fotos enquanto penteava o algodão. Ele contou um pouco da história, dos padrões, falou que lá os preços lá eram padronizados e começou a mostrar tapetes. O vendedor repetia sempre sobre como era uma cooperativa feminina e só mulheres trabalhavam lá, e eu fiquei na dúvida se falava algo ou não, até que uma menina canadense reforçou a visão na minha mente sobre as mulheres do Quebec serem feministas fodas e colocou a questão:

  • Menos você.
  • Com assim?
  • Você não é uma mulher, e você trabalha aqui.
  • Lógico, porque as mulheres aqui não costumavam ir para a escola, elas não tiveram educação, elas não falam francês, elas não falam inglês, como elas iam fazer esse trabalho? Eu estou aqui para ajudar, você entende que eu estou ajudando?
  • Mas hoje em dia, as meninas daqui vão à escola?
  • Claro, mas é um problema enorme. Agora que elas aprendem inglês e francês, elas não querem fazer tapetes.
  • Eu não acho que isso seja um problema.

Ele ficou visivelmente irritado e começou a ignorar a menina e trazer um tapete atrás do outro. Só que nesse momento estava claro que ninguém ia comprar nada, e a mesma canadense tentou avisá-lo gentilmente, e ele praticamente gritou que isso não era problema dela, que ele não estava forçando ninguém a nada, e que quem não tinha interesse podia ir embora sem problemas. Então todo mundo se levantou, e ele ainda fez uma última tentativa, oferecendo para um menino italiano alguns dos tapetes mais caros pelo preço dos mais baratos.

O guia nos encontrou de novo do lado de fora e nos levou para a van, e pediu educadamente se nós queríamos dar gorjetas. Eu achei que ele tinha sido o melhor guia do passeio, e contribuí um pouco.

Tour tres dias duas noites saara Tinghir loja de tapetes

Depois fomos levados para mais um restaurante caro e no meio do nada, com o motorista nos dizendo que era a última oportunidade de comer algo antes do Saara. Depois dirigimos mais algumas horas para chegar a Merzouga, a cidade conhecida como porta de entrada do Saara. Nós deixamos as mochilas grandes na van e levamos apenas os essenciais (água, papel higiênico, casacos, câmeras), já que só dava para levar o que pudéssemos transportar de camelo. A promessa tinha sido duas horas no camelo até uma vila bérbere isolada, onde teríamos jantar e músicas ao redor da fogueira. A realidade foi vinte minutos, um acampamento onde ainda dava para ver as luzes da cidade e guias tocando Shakira e tentando passar a mão nas mulheres viajando sozinhas.

Muita gente ficou super decepcionada, mas eu na verdade esperava um programa turistão, mas que seria uma boa introdução ao deserto. Ver as estrelas no Saara realmente compensou a maioria das desorganizações e armadilhas da viagem, e contei mais sobre a noite em outro post.

Saara Marrocos dunas por do sol

Dia 3

No terceiro dia, fomos acordados às seis da manhã pelos guias que entraram gritando nas tendas e começaram a imediatamente colocar as pessoas nos camelos para nos levar para o hotel onde teríamos o café da manhã – então não vimos o nascer do sol nas dunas, que deveria ser parte do tour.

Saara Marrocos andando de camelo de manhã

Tomamos café em um refeitório, enquanto os motoristas entravam chamando e as pessoas abandonavam o café pela metade e saíam correndo. Um casal português tinha que pegar o vôo de volta naquela mesma noite em Marrakesh, e eles tinham conversado com o motorista da van, que disse que nós todos tínhamos que estar prontos e na porta às oito.

As pessoas da nossa van tinham ficado em tendas diferentes e vindo em grupos de camelos diferentes, então foi só nesse momento que todos nos reunimos e começamos a conversar sobre a noite, até que alguém notou que o casal dinamarquês não estava com a gente. Nós começamos a perguntar para todo mundo do grupo, e percebemos que ninguém tinha visto os dois depois do jantar, na noite anterior. Nós ficamos preocupados e tentamos falar com alguém lá dentro, e eles disseram que o casal provavelmente tinha partido em outra van. Nós insistimos, falando que as mochilas deles estavam na nossa van, e ninguém nos levou a sério. Nós tentamos falar com o nosso motorista e ligar para o casal, sem sucesso. Nós ficamos com medo que eles tivessem resolvido fazer um passeio depois do jantar e se perdido nas dunas, porque os guias não estavam contando as pessoas, e era uma possibilidade real.

Uma hora depois eles apareceram, justo quando pedíamos para alguém tirar uma foto do nosso grupo e todo mundo começou a gritar “Pieter, Nadja, vocês estão vivos!”. 

Saara Marrocos crew

Depois eles nos contaram que eles tem sono pesado e simplesmente não acordaram com os guias gritando. Eles acordaram duas horas depois, e vendo o campo vazio acharam que todo mundo ainda estava dormindo. Finalmente, um dos guias os viu e tentou cobrar 400 dhs para trazer os camelos de volta (cerca de 40 euros, lembrando que a maioria das pessoas tinha pago 800 pelo passeio todo). Eles preferiram seguir a trilha e andar de volta para a cidade. Foi bom que tudo deu certo, mas achei um incidente bem sério. Se eles tivessem contratado o tour direto em Merzouga, sem ser parte de um grupo maior, e realmente ido para um passeio depois do jantar e se perdido, ninguém nem teria notado. Nesse ponto, é bom que nós estávamos tão perto da cidade e de outros grupos.

Nosso motorista, que tinha insistido tanto que devíamos ser pontuais para que o casal português não perdesse o vôo, chegou às nove (eles conseguiram, mas o motorista cobrou mais dinheiro deles, na última hora). Eu na verdade estava indo para Fez, mas tinha que esperar o motorista porque meu mochilão estava na van. Nesse meio tempo, tinha visto várias vans saindo para lá e não sabia se teríamos outra, e a van em que eu vim partiu depois de dizer vagamente que outra ia aparecer. Finalmente outra van veio, depois de mais uma hora e meia, com espaço para seis pessoas. Nós éramos sete esperando, então teve uma discussão se deveríamos nos apertar ou deixar alguém para trás uma menina alemã, que tinha chegado por último. Eu não gostava da idéia de deixar alguém para trás, principalmente uma mulher viajando sozinha, e achei bom que nos apertamos. Nós dirigimos direto para Fez, com duas paradas, além das curtinhas para usar o banheiro: uma para um almoço em um lugar caro onde ninguém nem entrou, mas onde tivemos que esperar meia hora de qualquer jeito, e outra na beira da estrada caso alguém quisesse tirar foto com macacos, onde ninguém nem saiu da van.

Quando eu cheguei em Fez, entrei em contato com o Hostel Majorelle em Marrakesh para reclamar que eles tinham cobrado preços diferentes. Eles negaram, e chegaram a falar que as pessoas estavam mentindo para mim sobre quanto tinham pagado.

Na van de volta, viemos todas conversando sobre como tudo foi desorganizado. Todas nós tínhamos reservado o tour em lugares diferentes (o meu recibo diz Sahara Scout Travel, o instagram deles é @morocco_oasis_tours, e outras pessoas fecharam com nomes diferentes), e todas concordamos que foi terrível. Duas meninas tinham pago pela tenda de luxo (1500 dirhams cada, para quem quer saber), e quando chegaram no deserto tiveram que brigar muito para consegui-la, enquanto eles tentavam cobrar mais. Elas me contaram de uma família canadense que tinhas duas crianças pequenas e tinha pedido por assentos para crianças na van, e quando chegaram lá, não tinha. Foi outra constante que eu vi, tudo o que você pede na hora da compra, seja para se juntar depois, como eu fiz, para ter assentos de criança (que era questão de segurança), para não ser levado para lojas, para escolher os restaurantes, para ser deixado no aeroporto e não no centro, tudo eles falam que pode, que vai ser como você quer, mas depois essa opção não existe ou eles te cobram a mais.

Alternativas a fazer um tour do Saara

Existem outras opções para fazer esse passeio, pelo menos até chegar a parte do acampamento no deserto, que é mais difícil de fazer por conta própria. Eu pelo menos, que nunca acampo, não teria a competência de planejar.

  • Dá para passar em todos os lugares antes de carro ou transporte público, o que provavelmente demoraria mais, mas daria para realmente vê-los.
  • Dá para pegar um ônibus diretamente para Merzouga e fazer só a parte do deserto, sem ter que contratar transfer.
  • Dá para contratar tours mais caros, que são mais organizados – só tenha cuidado de que seja um tour diferente, não pagar mais caro pela mesma experiência. O meu albergue em Fez, o Riad Verus, oferecia uma opção com duas noites no deserto, uma com os bérberes e uma com os nômades, que parecia interessante, mas não fui e não posso falar de experiência própria. Sei que ele me mostrou fotos e as tendas de luxo tinham aquecedores, enquanto as meninas que fizeram a experiência de luxo na minha van também estavam congelando.
  • Dá para ir em dunas menos famosas, mas mais próximas de outras atrações no Marrocos.
  • E claro, dá para fazer o mesmo passeio, mas sabendo dos problemas e torcendo para conhecer gente legal e no final sentir que valeu a pena.

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