La Bella Figura: um conceito italiano

Quando eu fiz um curso de italiano em Florença, fiquei hospedada com uma local, o que foi ótimo porque ela cozinhava para mim e os outros inquilinos, contava histórias e nos dava dicas de como visitar as cidades da Toscana. E, como frequentemente acontece nessas situações, o contato com gente de lá me proporcionou um choque cultural, mesmo a Itália sendo um país que a gente acha tão próximo do Brasil.

Acontece que essa italiana, a Lídia, pegou ódio de três americanas que tinham alugado um apartamento no nosso prédio. Ela sempre reclamava que elas falavam muito alto, chegavam bêbadas de madrugada e que elas andavam nuas. A primeira vez que ela disse isso, tive que parar para lembrar que roupas que elas usavam, que não tinham chamado a minha atenção nem um pouco. Elas sempre saíam com shorts jeans e regatas de alcinha. Exatamente do jeito que quase todo mundo ía para a aula lá em Florença, como eu via gente nas ruas o tempo todo, e do jeito como eu vou para a faculdade no Brasil. Achei que era implicância dela, mas depois ouvi de outras pessoas o quanto os italianos mais velhos odeiam os “turistas nus”. Andar assim é fazer a brutta figura (ou figuraccia, figura di merda), má impressão.

O contrário é a bella figura, um conceito bem difícil de explicar. Ele envolve saber interagir graciosamente com os outros em situações sociais, nunca se referir a alguém pelo pronome informal (tu) quando você deveria ter usado o formal (Lei), não comer ou beber andando, o vendedor embalar suas compras com cuidado. Em um sentido, é em parte o que chamamos de boas maneiras.

Mas a bella figura também tem a ver com como você se apresenta ao mundo. Meu roommate nunca sairia de casa com uma roupa amassada, tudo era cuidadosamente passado. Os italianos frequentemente usam roupas mais justas do que os brasileiros, e calça skinny com camisa de botão são praticamente um uniforme. Claro que existem lugares mais e menos formais, e que adolescentes se vestem como adolescentes, inclusive com os shorts apertadinhos que escandalizavam a Lídia. Mas para os mais velhos, chinelo ainda só é aceitável na praia, roupa apertadinha jamais, e verão é época de usar calça soltinha de linho, não shorts. É claro que você pode usar o que quiser, e vai ter gente menos rígida e outros turistas usando também. Se alguém quer atender os critérios deles entra na questão de como você interpreta esse conceito – se a bella figura é uma vaidade besta ou um trato cultural que pode fazer parte da experiência de viajar ou morar fora.

E também tem mais nela do que roupas, é claro. Também é como se comportar à mesa. Como eu disse, não comer ou beber andando na rua, nem sentado nos monumentos. Não ficar chamando os garçons o tempo todo como se eles trabalhassem para você. Não colocar parmesão em tudo. Saber o que acompanha o quê. Falei mais disso no post sobre como comer na Itália sem assustar os italianos.

Também tem um lado bem chato para os turistas. Os italianos muitas vezes falam um pouco de inglês, mas não respondem nessa língua porque acham que vão cometer erros e fazer uma brutta figura. Qualquer crítica a um serviço pode fazer o vendedor se sentir acusado de fazer uma brutta figura, e começar a se defender como se fosse um ataque pessoal, o que vira um campo minado.

Algumas pessoas fazendo intercâmbio comigo achavam que era uma noção narcisista que provava que os italianos eram superficiais, outros achavam que era uma parte importante da cultura italiana. Ou seja, é algo relacionado a aparência, não só física, mas de parecer ser culto e polido, de vaidade, ou é algo mais profundo, algo relacionado a séculos de preocupação com produzir o belo? É falsidade ou performance?

E aí, o que vocês acham sobre a bella figura? Tiveram experiências com essa idéia? Conta para a gente nos comentários.

A imagem do header vem de uma campanha do duolingo que usava palavras e expressões intraduzíveis.

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