Volta ao Mundo em Livros: Síria – No Knives in the Kitchens of this City

No Knives in the Kitchens of this City, de Khaled Khalifa, é mais um livro ótimo que eu li por causa do Prêmio para ficção árabe.

Esse livro foi vendido como uma forma de entender um pouco da situação da Síria no século XX e da atual guerra. Não foi fácil, e tive que consultar outros livros e sites para entender muito do que é falado, mas no final concordei.

“Cities die just like people. He couldn’t bear the smell of the ghetto that he was supposed to have no other choice but to live in, without hope of the siege upon it ever being lifted.”

O romance conta a história da sua família na cidade de Aleppo entre os anos 60 e os anos 2000. A mãe, uma orgulhosa professora de uma família importante, é talvez quem mais sofre com a decadência de sua família e da cidade que amava. Ela não suporta ver a cidade que se torna a cada dia mais violenta, os campos de alface substituídos por casebres miseráveis, Aleppo transformada de centro cultural em uma cidade claustrofóbica, em que falta oxigênio.

Ela tem quatro filhos: Suad, que morre cedo devido à uma deficiência, o narrador anônimo, marcado pelo sinal ruim de ter nascido alguns dias antes do golpe, em 1963, Sawsan, que o narrador chama sempre de “a irreprimível Sawsan”, que busca salvação de um extremo a outro sem encontrá-la, e o musicista perdido Rashid. Além deles, um dos personagens mais importantes é o tio deles, Nizad, homossexual que consegue viver de maneira relativamente aberta, apesar da repressão. Ele parece ser a única pessoa do romance capaz de viver consigo mesmo, e é quem providencia refúgio quando os outros precisam.

O livro fala bastante do desejo sexual e de sua repressão, e por isso foi taxado de pornográfico. Mas o seu tema principal parece ser a vergonha. Os personagens tem vergonha de trabalhar para o partido e da obrigação de honrar o presidente (nenhum dos dois é nomeado, mas sabemos que Khalifa está falando do partido Ba’ath e do ditador Hafez Al-Assad). É uma vergonha coletiva, uma deterioração coletiva, que mostra a cidade de Aleppo apodrecendo, e não surpreende que os sírios tenham ido à guerra sabendo que sua situação podia piorar, mas que ela tinha que mudar.

O título vem desse trecho:

“[A man] set his wife and four children on fire, then committed suicide with a kitchen knife as he screamed at his neighbors, who were watching dispassionately, that dying in a fire was more honorable than waiting to starve. He asked them bitterly, ‘Are there no knives in the kitchens of this city?’”

 

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