Três lugares que contam a história de Praga durante a Segunda Guerra: Parte II, a Igreja de São Cirilo

Com a República Tcheca ocupada pelos nazistas, líderes exilados em Londres formaram um governo de resistência lá. Eles decidiram organizar a resistência, com paraquedistas sendo treinados na Escócia e mandados à República Tcheca. Em 1942, eles resolveram organizar um atentado contra um líder nazista. O alvo escolhido foi Heydrich, comandante nazista que tinha dizimado a resistência e ficou conhecido como A Besta Loura e O Carrasco de Praga. E que tinha colocado as jóias da coroa tcheca na cabeça, como a gente falou no primeiro post da série.

Um tcheco, Jan Kubiš, e um eslovaco, Jozef Gabčík, foram escolhidos simbolicamente, como forma de ir contra a noção de que os tchecos eram resistentes e os eslovacos eram colaboracionistas. Depois de meses de preparação, eles acabaram fazendo o único atentado bem sucedido contra um nazista de alto escalão, no que ficou conhecido como Operação Antropóide.

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Kubiš e Gabčík cercaram o carro de Heydrich e Gabčík parou em frente ao carro com uma metralhadora. Que falhou. Heydrich tentou aproveitar o momento e reagir, mas Kubiš jogou uma bomba no carro. Ele errou o alvo e a bomba caiu embaixo do carro, mas Heydrich foi atingido por estilhaços, embora não tenha percebido imediatamente. Heydrich tentou perseguir os resistentes, que estavam convencidos que o ataque tinha falhado, mas desmaiou e teve que ser levado a um hospital. Por um tempo, pareceu que ele ia sobreviver, mas depois de uma semana ele morreu de septicemia. Os alemães da época não tinham acesso a uma droga nova que poderia tê-lo salvado, os antibióticos.

Depois da morte de Heydrich, represálias foram feitas em toda a República Tcheca. Qualquer um suspeito de ter uma conexão com o atentado era enviado a um campo de concentração. As aldeias de Lidice and Ležáky foram apagadas do mapa, todos os habitantes assassinados na hora ou enviados para campos. Kubiš e Gabčík se esconderam na Igreja de São Cirilo, junto com cinco outros membros da resistência. Por vários dias, o governo os procurou sem conseguir achar pista de onde estavam. Mas todo grande drama tem seu traidor, e o da Operação Antropóide se chama Karel Čurda. Ele era um membro da resistência que procurou o governo interessado na recompensa em dinheiro.

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Cartas de agradecimento

Čurda revelou os endereços de várias pessoas ligadas à resistência, inclusive da família Moravec. A senhora Moraveca se matou com uma capsula de cianureto ao ser presa, mas seu marido, que não estava envolvido com a resistência, e filho Ata, de 17, anos foram detidos. Ata foi obrigado a ver a cabeça da mãe em um tanque de peixes e torturado, e, sob ameaça que seu pai seria morto em seguida, contou onde Kubiš e Gabčík estavam escondidos.

750 soldados alemães cercaram a igreja na tentativa de capturar os sete membros da resistência. Os religiosos da igreja se recusaram a dar informações, e por horas a igreja foi revistada em vão. Finalmente, acharam a escada que levava ao sótão. Kubiš, Adolf Opálka, e Jaroslav Svarc, escondidos lá, resistiram por duas horas até serem mortos em uma explosão. Os alemães quase foram embora, pensando que tinham pego os dois responsáveis, mas resolveram continuar a busca.

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Gabčík, Josef Valcik, Josef Bublik e Jan Hruby estavam na cripta. Ao serem descobertos, resistiram por várias horas, matando 21 soldados alemães que tentaram entrar na cripta. Ata foi chamado novamente para tentar convencê-los a se renderem, mas se recusou a falar. O corpo de bombeiros foi chamado para tentar inundar a cripta, mas fizeram o pior serviço possível, tentando atrasar os esforços. Depois alguém resolveu mandar bombas de fumaça dentro da cripta, o que seria uma boa idéia se ela não estivesse parcialmente inundada: as bombas se apagavam sem fazer efeito. Os quatro homens escondidos tentaram cavar um túnel, mas vendo que não ia ser possível em tempo e prestes a serem capturados, eles cometeram suicídio.

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O bispo Gorazd assumiu toda a responsabilidade por esconder os resistentes, na tentativa de proteger os outros religiosos. Mesmo assim, todos eles foram assassinados. Hoje ele é considerado um santo pela Igreja Ortodoxa.

A história é muito bem contada no livro HHhH, de Laurent Binet, que foi vencedor do prêmio Goncourt e foi traduzido no Brasil pela Companhia das Letras.

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Hoje a cripta da Igreja é o Memorial Nacional aos Heróis do Terror Heydrich. A entrada custava 50 coroas (menos do que 2 euros) em fevereiro de 2015. Há folhetos com informações em várias línguas.

Clique aqui para ler a parte I, em que falo do Castelo de Praga, e a parte III, em que falo do Museu Judaico, na série sobre os lugares que contam a história de Praga durante a Segunda Guerra.

Clique na imagem para ler todos os posts sobre a República Tcheca.

Clique na imagem para ler mais sobre os lugares que eu visitei que nos lembram a história da Segunda Guerra

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9 comentários

  1. Rogério Matias

    Qual seria o endereço bem ao certo de onde Heydrich foi atacado? Saberia me dizer? Mais ainda, como se faz pra chegar até a cripta? É aberta a visitação pública em qual horário? Onde consigo maiores informações? Muito obrigado.

    1. Julia Boechat

      Oi, Rogério, tudo bom? Então, o ataque aconteceu em Praga 8, perto do Hospital Bulovka. Não sei te dizer mais certinho que isso. A cripta não tem um site oficial, mas creio que fica aberta de terça a domingo, das 9 às 17. Eu procurei no Google mesmo, e a mesma informação está no site do Lonely Planet e do Trip Advisor. Se você quer mais informações sobre o ataque, sugiro muito esse livro do Laurent Binet, o HhHH.

  2. Fernanda

    Aaaamoo esse livro do Binet. Gostei muito de como você contou essa história!

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