Ouarzazate – cinema na Kasbah

Ouarzazate entrou no roteiro de uma forma contraditória. A cidade sempre era sugerida como a Hollywood marroquina onde todos os filmes sobre desertos são gravados, mas quando eu procurava por atrações, a primeira que aparecia era sempre Ait Ben Haddou, a kasbah a 30 quilômetros de distância. E, por mais que Ait Ben Haddou tenha sido um passeio incrível, ainda acho que Ouarzazate mesmo ficou subvalorizada. Ela tem uma história rica e lugares para visitar, e vale a pena por si só.

Ouarzazate Kasbah Taourirt vista de fora
Ouarzazate começou como um ponto de convergência de caravanas que saiam dos Atlas e dos vales de Draa e Dades. Daqui, são 52 dias até Timbuctu, atualmente no Mali. Ela também é conhecida como “porta para o deserto”. A partir daqui, começa o Saara. No entanto, a parte mais fotogênica e visitada das dunas é ainda bem longe, a mais de um dia do carro, em Merzouga. Durante a colonização francesa, Ouarzazate cresceu como posto militar avançado.

Ouarzazate Kasbah exterior
Em Ouarzazate, fica a Kasbah Taourirt. Uma Kasbah era o ponto central de uma cidadela. Nessa região do Marrocos elas são tão numerosas que o governo, querendo promover o turismo na região, inventou o apelido de “estrada dos mil kasbahs”. Não sei se são mil, mas são numerosas e uma mais importante que a outra.
A Kasbah Taourirt foi construída por uma importante família berber como palácio e fortaleza, e é considerada uma das mais bem preservadas do país. Ela foi construída com a terra da região em vários níveis, com quartos dedicados às esposas e concubinas do pashá em cargo da cidade. Para quem está visitando, parece um labirinto, tristemente esvaziado de muitos de seus tesouros. Além dos quartos com detalhes gravados em madeira, eles têm exposições de arte.

Ouarzazate Kasbah interior
Depois que os franceses partiram, Ouarzazate começou a atrair muitas produções de filmes. Por ser um lugar considerado “exótico”, mas seguro, ela já se passou por Tibet, Roma antiga, Somália, Egito, basicamente qualquer lugar árido. Alguns dos filmes famosos filmados por lá são Lawrence da Arábia, A Múmia, A Última Tentação de Cristo, Cruzada, além de parte da terceira temporada de Game of Thrones. Foram tantos que a cidade ganhou outro apelido: Ouallywood. E o turismo também foca muito nisso, e ao redor da cidade ficam vários grandes estúdios que podem ser visitados, como o Atlas e o CLA. Como eu não estava tão interessada nos filmes, fiquei só pelo Museu do Cinema em frente a Kasbah, menor, mais barato, prático de visitar. Ele tem antigos sets que só pela variedade das arquiteturas, dão uma idéia de por quantos lugares diferentes Ouarzazate já se passou no cinema e na tv.

Depois de visitar a Kasbah e o Museu do Cinema, fiz um passeio pequeno pelo bairro que cerca a Kasbah, também construído de forma tradicional. É um lugar muito bonito e que vale a pena, mas foi um lugar difícil de visitar por causa do assédio dos moradores. Era só começar a caminhar para alguém começar a me seguir e apontar as atrações. Eu sabia que depois eles iam me cobrar, então falava que não precisava de um guia. E continuava assim.
– Eu não sou um guia, quero só melhorar meu inglês / te mostrar a hospitalidade do Marrocos / te levar em uma feira que só acontece uma vez por ano e olha que coincidência é hoje.
– Obrigada, mas eu quero andar sozinha.
(Continuavam me seguindo)
– Esse prédio foi construído durante a dinastia tal…
– Já disse que não quero um guia e te pedi para me deixar sozinha. Não vou pagar nada.
– Mas são só vinte dirhams.
Eu entendo que são pessoas pobres e que a cultura é diferente da nossa, mas a insistência e o papinho de não vou te cobrar quando eu sabia que eles me cobrariam estavam realmente me atrapalhando de curtir a cidade. Nesse ponto da viagem só comecei a fingir que não falava inglês nem francês e a responder todo mundo em russo. E mesmo assim tiveram dois que insistiram em gritar comigo em francês pronunciando cada sílaba para ver se eu entendia, não paravam de me seguir, e tive que fazer uma volta de 180 graus para me livrar deles. Cheguei a pensar que devia ter contratado o primeiro só para os outros não me importunarem.

Ouarzazate Kasbah parte em ruínas

Ouarzazate Kasbah bairro 1

Ouarzazate Kasbah bairro 2

Ouarzazate Kasbah bairro 3

Ouarzazate Kasbah bairro 4

Ouarzazate Kasbah bairro 5
Apesar dessa experiência ruim, ainda achei Ouarzazate maravilhosa e fiquei feliz que passei dois dias na cidade, ao invés de vinte minutos com os tours de três dias que saem de Marrakech em direção ao Saara (fechei esse tour em Marrakech e o peguei no meio, o que já contei por aqui, e acho que foi uma ótima decisão). Aliás, talvez tivesse ficado até mais se eu soubesse que o transporte para outras atrações lá perto era tão fácil. Fui para Ait Ben Haddou de transporte público, e vi várias vans que saíam também para os oásis de Fint e Skoura.
Durante a noite, fiquei no Cinema Riad. Acho que ele na verdade é em uma cidadezinha perto, porque você tem que atravessar a ponte e andar meia hora depois da Kasbah, mas é uma graça, decorado com pôsteres dos filmes feitos pela região, tem funcionários super atenciosos, um jantar muito bom e barato (melhor se você reservar antes, principalmente quando o albergue tá cheio) e vista para a cidade.

Ouarzazate vista albergue cinema riad

Clique na imagem para ler todos os posts sobre o Marrocos.

5 comentários

  1. Nadya luiza

    Essas paisagens parecem até ficção de tão lindas e diferentes do que estou acostumada a ver. Com o seu relato, então, sempre denso de informações mas absolutamente fluido, literatura pura. Que experiência incrível! Saudade!!

    1. Julia Boechat

      Nadya, fiquei muito feliz com seu comentário! Primeiro por ouvir de você, que eu também tô com saudades, e segundo que me dá prazer e orgulho ouvir que você tá curtindo o blog. Muito obrigada, e vem visitar quando você puder 😍

Deixe uma resposta